Faísca: Coluna de Gabriela Soares traz análise de filme que retrata o papel da mulher na sociedade

  1. Essa coluna não é sobre um filme de animação…

 

Resolvi hoje escrever uma coisa diferente, mas que não fugisse do que é o foco dessa coluna: mulheres. Mas antes, me deixem contextualizar…

 

Nos últimos dias resolvi pensar um pouco menos em obrigações durante o final de semana e me permiti ver um filme de animação. Elementos, filme da Disney lançado no segundo semestre desse ano, traz uma narrativa perfeita sobre o que pensamos, sentimos e temos em nossos ombros quando somos mulheres – mães – filhas – jovens – sujeitas.

 

(Antes de seguir, saiba que pode encontrar leves spoilers, mas acredite, não irá atrapalhar sua experiência futura com o filme.)

 

O enredo da animação trata, como o nome já diz, sobre os elementos da natureza – fogo, água, terra e ar -, tendo como principal personagem uma menina-mulher, do elemento fogo. Faísca surge como uma “criança” curiosa, aventureira, que sonha em herdar a “A loja do fogo”, empreendimento que seus pais começaram do zero. A todo momento sua evolução evidencia sua personalidade forte, sua perspicácia, seu desejo de que cresça rápido para que “tudo aquilo possa ser seu”, já que é isso que seu pai sempre diz. Não é sobre o poder, é sobre a conquista; sobre o quão importante ela considera a tarefa de substituir seu pai.

 

No pano de fundo, temos a mãe, que além de trabalhar na loja e incentivar a filha, repete a todo momento que ela deve se casar. Mais que isso, casar-se com alguém do elemento fogo. Duas visões “opostas” ou “complementares”? A menina criada para ser chefe; gerenciar o negócio da família para que seu pai pudesse descansar. A menina que ouve da mãe que precisa se casar – e com um par previamente determinado:u m “igual”.

 

Foi aí que percebi que não era só uma animação: era uma reprodução fiel do que nós mulheres passamos durante toda a nossa vida. Em uma ou outra medida temos em nós a projeção do que outras pessoas gostariam que fosse, sejam nossos pais, irmãos, avós… Em determinado ponto do filme, Faísca se vê sendo absolutamente tudo aquilo que os outros não esperavam dela. Não tem paciência para lidar com os clientes – coisa que é 99% da rotina do seu futuro -, não consegue se imaginar como uma mulher que precisa casar e, pra finalizar, se encontra apaixonada por um oposto: um “cara de água”.

 

Ela sofre, se perde, perde a cabeça inúmeras vezes; é ríspida, distorce a verdade pra que a narrativa caiba no que esperam dela. Vejam. Distorce a narrativa para caber na expectativa do outro. Quando se descobre, quando finalmente – influenciada pelas inúmeras possibilidades que surgem em sua vida – ela consegue acolher o que sente, percebe que nada era o que ela queria. Descobre outros talentos, hobbies e descobre também o amor. Inexplicável, sem aviso prévio: a vida achou de mostrar a ela que há sempre muito mais.

 

Nesse momento, entendi que não era só uma animação. Elementos resumiu em pouco menos de 2 horas toda uma vivência comum a muitas mulheres.

Respondemos a projeções de vida, de carreira, de vontades e convenções do outro e do mundo, passamos por muitas batalhas de dor, revolta e sensação de estarmos perdidas.

 

Mas, sabe o que mais Elementos me ensinou? Não importa o quanto doa, o quanto demore, o quanto pareça impossível e desimportante: ouvir a nós mesmas no meio de uma multidão de expectativas é sempre possível. Mulher é fogo, assim como Faísca, que se mistura a muitos elementos e se faz nova; viva. Definitivamente essa coluna não é sobre um filme de animação.

Deixe um comentário