O ALIENÍGENA (PARTE VII)
Clauder Arcanjo*
Pintura O Violeiro, de Almeida Júnior.
Madame Brizolete Hernandes conquistou depressa a pequena cidade. Os comerciantes, confiantes, voltaram à Pedra do Mercado, ofertando seus produtos, mercadejando com os licanienses que, aos poucos, voltavam a transitar pela velha província. Padre Araquento rezou uma santa missa: meia dúzia de beatas compareceu, rogando ao Raimundo Sacristão que mantivesse as portas cerradas. Nunca Licânia soubera de uma missa tão ligeira: os incréus atribuíram tal brevidade ao medo que imperou entre uma leitura e outra.
O que ninguém contava, caros leitores, era com o que logo se daria. Contarei depressa, não sou chegado aos circunlóquios. Em questão de efabulação, defendo a linha reta. Em linguagem nem tão castiça, eis o meu mandamento: mata-se a cobra e mostra-se o pau.
— Pois bem, onde eu estava mesmo?
“O que ninguém contava…”
— Sim, não precisam gritar, seus apressados! Pois muito bem: o que ninguém esperava deu-se.
“E o que se deu?”
Aguardem aí que eu preciso molhar a boca. Conversa detalhada, vocês sabem, seca os lábios e a garganta.
Ô água santa! Ahã… Agora continuarei.
“Ô escritor para gostar de um espichado!”
— Espichado é o cabelo do seu fiofó, cabra mal-educado!
“Olha o respeito, novelista de araque!”
Nisso começou uma confusão dos diabos entre mim e um dos leitores. Por questão de paz social e literária, interromperei este capítulo. Voltarei quando a situação estiver sob controle.
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Madame Brizó tangeu todo mundo para dentro de casa. Na base do sopapo. Não era de perder tempo com admoestações.
Nisso, o clima entre os dois mais se aguçou.
“Quem eram esses dois?”
— Se acalmem! Se acalmem! Olhem que Brizolete pode fazer com que esse nosso encontro se interrompa mais uma vez.
“Tudo bem, mas se avexe!…”
Brizó e Robertão Social não resistiram ao charme um do outro. “Esses olhos me matam!”, assumiu o pretenso detetive. “Esse jeito de sonso tocou meu coração!”, rendeu-se a Dama da Conspiração.
De início, lutaram com todas as forças para não se entregarem aos apelos do Cupido em pleno Vale do Acaraú.
— Madame Brizolete, a sua missão a espera. Esse tal de Robertão não vale um…
Para que eu fui mexer com a onça? Ela sacou mais do que vexada o punhal com cabo de madrepérola e apontou-o para a ponta do meu queixo.
— Não diga mais nem uma palavra!
— …
Foram as reticências mais silenciosas que já vi em toda a minha vida de escrevinhador de província.
Robertão Social, ao presenciar tal cena, caiu ainda mais de amores pela valente dama.
Com pouco mais, saíram. Foram vistos sentados num banco na Praça do Poeta, arrulhando de paixão um pelo outro. Ela, entre um beijo e outro, a recitar poemas de Ilane Ferreira Cavalcante.
Quando deu meia-noite, à primeira badalada do relógio da Matriz, a cidade ouviu…
Deixarei o ocorrido para o próximo capítulo. Não tenho condições de continuar esta narrativa.
“O que houve?”
— Não tenho condi…
Pernas para que te quero!
*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.