A ALARMANTE TAXA DE ANALFABETISMO NA REGIÃO GEOGRÁFICA IMEDIATA DE AÇU (RN)

Joacir Rufino de Aquino & Raimundo Inácio da Silva Filho

(Professores e pesquisadores da UERN)

 

No início dos anos 1960, o renomado educador Paulo Freire chegou ao Rio Grande do Norte (RN), com a missão de ajudar o nosso estado a combater o analfabetismo que assolava boa parte da população potiguar. A experiência pioneira do método pedagógico inovador adotado foi realizada no município de Angicos, demonstrando ser possível ensinar, de maneira contextualizada, uma pessoa adulta a ler e a escrever em apenas 40 horas. Esse resultado animador parecia indicar que o problema seria resolvido com facilidade. Entretanto, essa chaga social ainda persegue o Brasil e o “nosso elefante” em pleno século XXI.

 

De fato, desde as famosas “40 horas de Angicos”, já se passaram mais de 60 anos e o drama do analfabetismo ainda vitima muita gente. Segundo dados do Censo Demográfico 2022, divulgados no mês passado pelo IBGE, 7% da população brasileira com 15 anos ou mais era analfabeta, ou seja, não sabia ler e escrever ao menos uma carta simples. Já a situação do RN se apresentava bem pior do que no conjunto da nação, pois 13,9% dos potiguares na faixa de idade citada eram analfabetos. Evidentemente, esse indicador varia para cima ou para baixo, conforme a realidade dos municípios agrupados em cada uma das 11 regiões geográficas imediatas do estado, classificação adotada para substituir a antiga divisão em microrregiões.

 

No caso da Região Geográfica Imediata de Açu, que congrega 17 municípios, os números do analfabetismo revelados pelo Censo Demográfico 2022 são alarmantes e frustrariam até as expectativas do educador Paulo Freire se ele fosse vivo atualmente e revisitasse a região depois de tanto tempo. Isto porque em todos eles a taxa de analfabetismo é superior a média nacional e estadual, seguindo essa ordem: Macau (14,9%), Guamaré (16,0%), Alto do Rodrigues (16,1%), Pendências (17,5%), Assú (17,7%), Lajes (18,2%), Itajá (19,2%), Angicos (19,3%), Carnaubais (19,7%), São Rafael (21,5%), Ipanguaçu (22,2%), Afonso Bezerra (22,6%), Paraú (23,2%), Fernando Pedroza (23,3%), Porto do Mangue (23,9%), Triunfo Potiguar (25,3%) e Santana do Matos (25,6%).

 

A gravidade dos números apresentados ganha outros contornos quando desagregamos as estatísticas por faixa etária. Em 2022, das 33.729 pessoas de 15 anos ou mais que não sabiam ler e escrever uma simples frase na Região Imediata açuense, 570 (1,7%) tinham de 15 a 19 anos; 624 (1,9%), de 20 a 24 anos; 1.873 (5,6%), de 25 a 34 anos; 4.376 (13,0%), de 35 a 44 anos; 6.966 (20,7%), de 45 a 54 anos; 8.081 (24,0%), de 55 a 64 anos; e 11.239 (33,3%), de 65 anos ou mais. Logo, o analfabetismo atinge mais de mil jovens, um expressivo percentual de adultos e, especialmente, um numeroso contingente de homens e mulheres acima de 55 anos.

 

A situação educacional precária retratada pela pesquisa do IBGE reflete uma realidade complexa e sinaliza enormes desafios para as políticas públicas no presente e no futuro. Grosso modo, percebe-se que as transformações econômicas ocorridas na região açuense têm apresentado dificuldade para melhorar a qualidade de vida das pessoas. As economias municipais crescem, as enchentes de investimentos em “energias verdes” avançam velozmente sobre suas áreas de caatinga, aumentam seu Produto Interno Bruto (PIB), mas os resultados mais pomposos na produção de riqueza parecem que não são canalizados no volume necessário para melhorar os níveis do capital humano local. Tal fato gera reflexos negativos na qualidade do mercado de trabalho, nos indicadores de produtividade das economias municipais, bem como nos níveis de participação popular em pautas importantes para o desenvolvimento regional, a exemplo da questão ambiental.

 

Diante desse cenário, como equacionar o problema? Há muitos caminhos possíveis que exigem compromisso político governamental e passam pela melhoria da qualidade das escolas, contratação de professores, educação de jovens e adultos etc. Outra inciativa estratégica é a identificação das pessoas analfabetas em cada localidade para focalizar as ações. Mas tudo isso será em vão sem a adequação dos métodos de ensino e dos currículos escolares ao contexto regional em que as pessoas habitam. Para tanto, a releitura da obra de Paulo Freire pode iluminar horizontes para a criação de uma estratégia de planejamento que tenha como meta a erradicação do analfabetismo no território açuense, visando ampliar as liberdades individuais da população e fortalecer sua capacidade de enfrentar os desafios do mundo globalizado em que vivemos.

Deixe um comentário