A revolução sonora dos Beatles

Alex Medeiros @alexmedeiros1959

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Na última terça-feira, passei uma tarde inteira e conceptiva a bordo do estúdio de gravação do músico Zé Marco, tecladista da banda Mad Dogs. Fui à tiracolo com Babal acompanhar a criação das guias para canções que comporão nosso disco (e se digo disco é LP vinil) que irá comemorar 45 anos de uma parceria, iniciada na nossa tenra juventude na garagem e sala de Dona Elvira (mãe dele), na Candelária, onde morávamos todos nós, eu e eles os irmãos Eris.

Diante da parafernália de equipamentos de som e instrumentos maravilhosos, fui tentado a puxar conversa sobre a distância tecnológica que nos separa agora dos tempos em que os Beatles gravaram seus discos num estúdio com apenas quatro (4) canais. Eu aloprei dizendo que qualquer adolescente hoje com um celular tem mais recursos do que os quatro rapazes de Liverpool, no que fui assentido por Zé Marco, Babal e o violonista carioca Rodrigo Garcia.

Por décadas ouvi papos e debates sobre gravações estéreo e mono dos Fab Four, a loucura que foi gravar em quatro canais para uma máquina de rolo de quatro trilhas, para depois mixar num toca-discos desses domésticos.

Lembrei de um filme deles com o produtor George Martin com a fita de rolo original para a música Strawberry Fields e isolando a bateria numa mesa de mixagem, isolando também o Mellatron de abertura na canção. Uma loucura.

Vemos McCartney sentado próximo da mesa de mixagem ouvindo seu baixo isolado na experimentalíssima St. Peppers Lonely Hearts Club Band. E John Lennon num boogie-woogie levado no Epiphone Casino, sem amplificador.

Sem dúvida, foi o primeiro grupo a revolucionar a perspectiva auditiva das gravações e fazer com que aquilo parecesse um truque desafiando a capacidade eletrônica daqueles dias. Com 4 canais fizeram 400 revoluções.

O clima de março-abril no estúdio de Zé Marco lembrou que foi nesse mesmo período que os Beatles gravaram o Álbum Branco, o único duplo deles e considerado o mais diversificado em gêneros e ritmos, um som múltiplo.

E pensar que a obra quase foi pro brejo, salva pelo fato deles irem para a Índia contemporizar a badtrip esotérica de George Harrison que se tornou pupilo do guru Maharish Mahesh, um entre tantos papos-furados filosóficos que surgem.

Entre a viagem e a gravação (a primeira no então novo estúdio Apple Records) terminada em maio de 1968 – mais simbologia impossível – deu-se início à polêmica da interferência de Yoko Ono sempre presente ao lado do marido.

Mas, a verdade é que o álbum The Beatles (White Album) ficou para a história como uma ressonância que identifica para sempre a capacidade criativa dos quatro gênios. Um disco onde encontramos todos os bons ritmos do som pop.

Nenhum outro, deles ou de outros, tem tanta diversidade musical. Tem rock ‘n’ roll raiz em Back in the U.R.S.S e tem muito heavy metal em Helter Skelter.

E se a pegada for punk, ouça Everybody’s Got Something to Hide Except Me and My Monkey (e vá logo desconsiderando racismo no duplipensar de Pindorama). Quer um folk meio Bob meio Woody? Vá de Blackbird Blues!

Falando em blues, apura o ouvido para Yer Blues; se quer viajar na onda psicodélica de antanho, flutue com Dear Prudence. Mas se preferir uma coisa assim rock progressivo, duelo ao por do Sol, vai de Happiness Is a Warm Gun.

Tem balada para relaxar com charuto na varanda, como I’m So Tired; e até um pop pet para pessoas que dançam com seus cães: Martha My Dear. E se a companhia for crianças, nada melhor que rodopiar em Ob-La-Di, Ob-La-Da.

Fizeram tudo em quatro canais, como quem pilota a Enterprise com motor de Cinquetinha

Publicada em Tribuna do Norte

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