Mulheres hétero francesas buscam cada vez mais parceiras sexuais do mesmo gênero

A sexualidade da população francesa está em uma surpreendente evolução. Com práticas menos ditadas pela heterossexualidade, a quantidade de relações sexuais tradicionais diminui, enquanto aumenta o interesse das mulheres da França por parceiras do mesmo gênero. É o que mostra um vasto estudo do Instituto Nacional da Saúde e da Pesquisa Médica (Inserm), divulgado nesta semana.

Por
RFI

A vida sexual dos franceses e francesas está menos intensa? Os pesquisadores duvidam dessa hipótese, mesmo que o novo estudo do Inserm sobre a sexualidade na França aponte que a quantidade de relações sexuais vem diminuindo no país. O balanço – o quarto do gênero em 50 anos – ouviu mais de 31 mil pessoas com idades entre 18 e 89 anos e aponta que as experiências estão se diversificando, principalmente entre as faixas etárias mais jovens, onde cresce a rejeição da heteronormatividade.

A principal conclusão do estudo é que as práticas sexuais na França estão se transformando, principalmente entre as mulheres. As francesas estão experimentando outras formas de relações sexuais que não se limitam à penetração. É entre elas que também cresce a masturbação, praticada por mais de 42% das cidadãs em 1992, e que deu salto de mais de 30 pontos (72%), em 2023, ano em que o estudo do Inserm foi realizado.

Entre as francesas, aliás, 13% dizem terem sentido atração por pessoas do mesmo gênero, ainda que apenas 1,3% se declarem lésbicas. No quadro geral, quase 9% de mulheres e homens na França já tiveram ao menos um parceiro sexual do mesmo gênero. Mas, pela primeira vez em 50 anos, na faixa etária dos 18-29 anos, a quantidade relações sexuais entre mulheres (15%) é maior do que entre homens (10%).

Transformações sociais

De acordo com os pesquisadores do Inserm, vários indicadores justificam essas mudanças na sexualidade da população francesa. Primeiramente, a aceitação e a tolerância à homossexualidade e à transidentidade é maior do que nas últimas décadas. Quase 70% das francesas e mais de 56% dos franceses veem a homossexualidade como uma orientação sexual comum. O número é um pouco menor para a aceitação da transidentidade, tolerada por quase 42% das mulheres e por mais de 31% dos homens.

No entanto, em relação especificamente às mulheres, os pesquisadores têm outras explicações para o interesse crescente das francesas heterossexuais por experiências com pessoas do mesmo sexo. O principal motivo é o movimento Mee Too, que suscitou uma imensa mobilização social contra as violências e agressões sexuais e também sensibilizou e educou as mulheres sobre consentimento.

A pesquisa do Inserm também mostra que quase 30% das francesas de 18 a 89 anos entrevistadas declararam já terem sido forçadas a ter uma relação sexual, contra quase 16% em 2006. Esse aumento também é observado entre os homens, embora seja menor: 8,7% dos franceses ouvidos para o estudo disseram já terem sido forçados a ter uma relação sexual, contra 4,6% no balanço anterior, realizado em 2006.

Pandemia afetou sexualidade na França

A pandemia de Covid-19 não mexeu apenas com a saúde dos franceses, mas afetou também as relações sociais e a vida sexual dos indivíduos. Os sucessivos lockdowns tiveram um impacto na iniciação dos jovens ao sexo, elevando a média da idade da primeira relação sexual das mulheres para 18,2 anos e 17,7 anos para os homens (contra 17 anos na média de 2006).

Em todas as faixas etárias, a quantidade de relações sexuais também diminuiu na França. Em 1992, mais de 86% das mulheres e 92% dos homens afirmavam ter tido relações sexuais ao longo do ano, mas em 2023 esse número caiu em média dez pontos tanto para as mulheres quanto para os homens.

O fenômeno também é justificado pela “digitalização” das práticas sexuais, principalmente entre os mais jovens. Segundo o Inserm, 33% das francesas e quase 47% dos franceses tiveram uma experiência sexual online com outra pessoa em 2023. A faixa etária dos 18 aos 29 anos, por exemplo, é a que mais “normaliza” o envio de “nudes” – como são chamadas fotos das partes íntimas mandadas por aplicativos de mensagens. Quase 40% dos franceses e francesas entrevistados para o estudo já compartilharam esse tipo de conteúdo.

A digitalização da vida sexual é muito comum entre os jovens. Entre as pessoas de menos de 30 anos aqui na França, mais de 39% das mulheres e mais de 43% dos homens já encontraram parceiros sexuais na internet, seja por meio de sites ou de aplicativos.

Satisfação sexual aumenta

Todas essas mudanças não parecem afetar a satisfação sexual da população francesa. Em relação ao balanço de 2006, aumentou a quantidade de mulheres francesas que afirmam estar “muito felizes” com sua vida sexual, 45,3% (contra 43,6% há oito anos). Entre os homens, no mesmo período, a satisfação sexual saltou de 35% para 39%.

“Todo o discurso que consiste em dizer que a igualdade entre os sexos e o feminismo desestabiliza os homens em sua sexualidade e sua virilidade não é comprovada nesse estudo”, afirmou a socióloga Nathalie Bajos, diretora de pesquisa do Inserm, na apresentação do trabalho.

Esse foi o quarto balanço do gênero realizado na França desde os anos 1970. Mais de 31 mil pessoas, com idades entre 18 e 89 anos, foram entrevistadas por telefone para a pesquisa no ano passado, em um trabalho que durou o total de cinco anos, com parceria da Agência Nacional de Pesquisa Científica (ANRS).

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