PÍLULAS PARA O SILÊNCIO (PARTE CCCLXIV)

 

Clauder Arcanjo*

(Xilogravura “Chuva”, de Oswaldo Goeldi)

 

Negaças

 

Não me leia como quem busca uma tábua de salvação. Muito menos se anda à cata de um motivo ou pretexto para enterrar a sua angústia.

Não, nego tal pretensão neste meu texto. Hoje, caro leitor, ouso lhe dizer que almejo deixá-lo ainda mais incomodado. Falar a você que o mundo não está para amadores, que os heróis de outrora cheiram a embustes ou a trapalhões no teatro da vida.

Repare bem no riso que o cerca. Há nele um quê de loucura, ou a flacidez de lábios que fingem rir, quando o que melhor lhes caberia é o travo do choro.

Nunca acredite totalmente naqueles que o consolam. No mais das vezes caluniam sobre as suas certezas e tentam se ancorar na credulidade alheia para permanecerem de pé. O chão os cairia bem melhor, não resta a menor das dúvidas.

Se a minha página não é para menores de idade?! E quem aqui tem a métrica ajustada para contar os anos de maturidade? Eu não disponho de tal instrumento. Medir o amadurecimento intelectual pelo número de anos de um indivíduo levará a um erro hiperbólico. Conheci homens que ainda não deveriam ter saído do jardim de infância, assim como tive a surpresa de conversar com garotos que me levaram à raia do pensamento complexo.

Companheiro Acácio não pode negar que o gato Nabuco tem mais clareza de raciocínio que muitos pretensos doutores incensados pela mídia e pela academia.

Certa vez rabisquei um texto com palavras sem nexo: nasceram parágrafos sem pé nem cabeça. Quando dei um ponto final, na base do desespero por tanta falta de fundamento naquilo que sujava a página, resolvi rasgá-lo de imediato. Eis que um desses doutos se aproximou de mim, a me pedir licença para ler tal exercício de loucura literária. Não precisou de mais do que cinco minutos: esbravejou aos presentes que nascia ali um novo estilo literário. Pediu palmas para mim, lendo em voz alta o esbulho que eu parira.

Não, nego tal louvação. Deixem-me aqui, preso ao negativismo oportuno. Negar, contrapor… são verbos desprezados nos dias de hoje. E como eles fazem falta para escavarmos o poço da lucidez!

Não terminarei esta página, recuso-me. Não a encerrarei com conclusões de monta, com fechos filosóficos de ouro ou com oximoros desprezíveis. Não, entrego a você, leitor, apenas tantas negativas. De tudo e para tudo. Se tenho certeza quanto ao que nego?! Não sei e quero desafiar aqueles que fingem que sabem.

Nego. Nego. Nego. Três vezes. Se não mais é… porque cansei. Minha única certeza.

 

*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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