PÍLULAS PARA O SILÊNCIO (PARTE CCLXIII)
Clauder Arcanjo*
(Pintura “Vênus no espelho”, de Peter Paul Rubens)
Amargo, não…
“Há a terra onde nós nascemos, e há a mulher que nós amamos. Tudo mais é reflexo…”
(Alvaro Moreyra, em As amargas, não…).
Nesta manhã chuvosa, o cheiro de terra molhada me transpõe para a província. A mulher que eu amo, bem junto a mim, mata a saudade do meu chão.
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Nos reflexos dos teus olhos, a certeza da refração da luz da minha paz.
A cidade nem sabe o que sinto por ti. Pouco importa, a tua beleza, amada, e o conforto do teu colo me bastam.
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Só me agrado da noite quando divido o leito com ela. Ela a me dizer: “Não ligo para o teu sono atribulado, muito menos a sinfonia dos roncos; e acho lindo quando usurpas, no meio da madrugada, os lençóis só para ti.”
O amor tem razões indecifráveis.
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Cobri teus olhos e pedi: “Me mostra por onde anda a estrela da manhã.”
Viraste e, de olhos fechados, beijaste-me os lábios, ardente, a me confessares: “Está sempre em mim, quando estás aqui!”.
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Há dias em que a paixão nos deixa parvos, o amor nos cobre de tolices, e a comunhão dos corpos instala a república do silêncio entre nós dois. Enfim, em tais momentos revelamo-nos a própria definição de almas gêmeas.
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“O tempo feliz é sempre o tempo que passou.”
Ao ouvir tal sentença, ela se rebelava contra o lugar-comum e se punha a soprar-lhe carícias presentes, até jogar por terra a máxima, julgada por ela, tão descabida.
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Seu amado era lobisomem, todos professavam nas calçadas de Licânia.
Isso porque, nas noites de sexta, ela ficava só, a esperá-lo uivando de paixão.
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Muitos louvam a minha calma. Puseram tal máscara em mim, e eu não consigo mais me libertar dessa condenação.
Há momentos em que a fúria é a melhor resposta.
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Faz-se imperioso devolver ao circo os melhores palhaços. Na política, reparem bem, há uma boa geração de bufões.
“Nunca um desejo me afligiu. A imaginação me deu tudo.”
(Alvaro Moreyra, em As amargas, não…).
*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.