Thadeu Brandão – Indicadores em prevenção municipal de criminalidade
Nas administrações municipais estão em curso basicamente duas concepções distintas sobre a atuação dos municípios na esfera da segurança: de um lado, estão as propostas que enfatizam o papel das guardas metropolitanas no combate à criminalidade: aumento dos efetivos, compra de mais armamentos ou equipamentos, concessão de poder de polícia às guardas, melhorias no treinamento, limitando, assim, o debate sobre segurança à questão do policiamento. Essas propostas denotam uma compreensão bastante convencional do problema da segurança pública e ausência de criatividade sobre o como o poder municipal poderia ser utilizado para combatê-lo
Apresentam-se novas propostas que apresentam uma abordagem alternativa, enfatizando o caráter interdisciplinar, pluriagencial e comunitário na problemática da segurança. Esse modelo alternativo partilha a visão de que ‘segurança’ deve deixar de ser competência exclusiva das polícias para converter-se em tema transversal do conjunto das políticas públicas municipais, uma vez que a ação policial é somente uma das formas de se abordar condutas anti-sociais. Pluriagencialidde quer dizer que a segurança pública diz respeito a múltiplas agências dentro do município, para além da Guarda Municipal. Ao enfatizar a participação comunitária, por fim, ressaltam que segurança pública é função do poder público, mas exercida em conjunto com a comunidade, tanto no planejamento como na execução de programas preventivos.
Assim,
“(…) diversos outros instrumentos que vão muito além da guarda: benfeitorias urbanas – iluminação, limpeza, poluição sonora, visual e ambiental; medidas para ampliar a educação, cultura, esportes e lazer para os jovens, especialmente na periferia; atuação em parceria com o governo estadual; criação de uma Secretaria Municipal de Segurança Pública; criação de conselhos de segurança com a participação da comunidade e em descentralização das ações; campanhas de mobilização, conscientização e informação cidadã contra armas, discriminação e violência; fiscalização e concessão de alvarás para estabelecimentos que têm envolvimento frequente com crimes e contravenções, como desmanches e bordéis; reorientação das GCMs para a implementação de uma polícia comunitária, frisando aspectos como policiamento preventivo, a pé, recrutamento na comunidade e integração com a comunidade” (KAHN, 2005, p. 49).
A necessidade de apontar indicadores que permitam a análise e o diagnóstico para prevenção de segurança pública a nível municipal é salutar. Abaixo, seguem as sugestões de Tulio Kahn (2005) acerca dos principais indicadores a serem analisados nesse processo:
“Indicadores econômicos ou monetários: gastos/recursos/valores
- anos de vida produtiva perdidos em razão dos homicídios ou invalidez gerados pela violência;
- gastos com o sistema de justiça criminal: penitenciárias, polícia, judiciário, ministério público (absoluto, médio e per capta);
- gastos com o Fundo Nacional de Segurança Pública, Fundo Penitenciário Nacional e outros fundos (absoluto, médio e per capta);
- gastos com seguros e valores pagos pelas seguradoras;
- monitoramento da atividade comercial e mudança na utilização de áreas antes degradadas pela violência;
- recursos arrecadados por taxas e emolumentos judiciais;
- valor das drogas apreendidas;
- valor dos imóveis em áreas degradas pela violência;
- valor dos objetos, cargas, recursos recuperados” (p. 78-79).
“Indicadores diretos e objetivos: paradigmas clássicos – indicadores que reagrupa crimes segundo certos critérios: grau de violência, instrumento utilizado, relacionamento entre autor e vítima, motivação, local de ocorrência
- crimes cometidos com uso de armas de fogo (homicídio, latrocínio, roubo, estupro, sequestro, etc.), crimes cometidos com explosivos;
- crimes de ódio, incidentes terroristas;
- crimes envolvendo pessoas que se conhecem (domésticos, passionais);
- índices de criminalidade simples e ponderados: Índice de Criminalidade de Kahn, Crime Index Norte-Americano;
- ocorrências nos parques federais, campi universitários, locais de trabalho, nos transportes aéreos;
- processos judiciais: proporção de casos arquivados, pendentes ou encerrados com a condenação ou absolvição do autor;
- taxa de ‘crimes violentos’;
- total de crimes;
- número e taxa de furtos ou roubos de veículos/veículos registrados;
- razão entre veículos roubados/veículos registrados (para alguns tipos de crimes, é preciso tomar cuidado com o que se vai levar em conta como base o número de veículos registrados e não a população. A mesma observação é válida para outros tipos de crime para os quais não faz sentido tomar como base a população).” (p. 79).
“Recursos humanos alocados no sistema de justiça criminal (com estes indicadores e os indicadores diretos (números de boletim de ocorrência, processos, prisões, etc.) é possível montar estatísticas de performance ou worload)
- número absoluto de policiais, bombeiros, juízes, promotores, carcereiros, vigilantes particulares, guardas civis, segundo características relevantes (sexo, idade, cor etc.);
- taxa de policiais por 1000 ou 100 mil habitantes (depende do tamanho da população);
- número médio de funcionários (por batalhão, delegacia, unidade prisional);
- razão homem/mulher em cada ocupação;
- razão entre atividades fim/atividades meio;
- salário base, salário máximo e número médio de anos necessários para alcançar o salário máximo” (p. 80).
“Indicadores de violência da polícia ou contra a polícia
- inquéritos instaurados nas corregedorias/expulsões de policiais;
- número de policiais mortos ou feridos;
- número de suicídios e taxas de suicídios por 100 mil habitantes entre policiais;
- proporção de suspeitos mortos no universo dos homicídios;
- relação policiais mortos/suspeitos mortos;
- relação suspeitos mortos/suspeitos feridos” (p. 80-81).
“Fluxo do sistema de justiça criminal – indicadores para montar o ‘funil’
- estimativa de vitimização;
- chamados recebidos pelo Copom;
- boletins de ocorrência registrados nos distritos policiais;
- inquéritos policiais iniciados;
- processos julgados;
- condenações à prisão” (p. 81).
“Paradigma clássico (indiretos o que a polícia obtém: outcomes
- número de armas apreendidas;
- número de prisões efetuadas pela polícia;
- número de prisões por policial (workload: número de inquéritos por promotor; número de processos por juiz; número de presos por funcionário do sistema penitenciário, etc.);
- quantidade de drogas apreendidas (unidades de peso);
- quantidade de drogas destruídas (numero de pés, quilos, etc.);
- taxa de crescimento de crimes, por tipo de crime;
- tempo de atendimento das ocorrências do recebimento do chamado à chegada ao local do crime;
- tempo de atendimento dos chamados telefônicos;
- veículos recuperados, taxa de recuperação de veículos” (p. 81).
“Paradigma comunitário
- número de participações em eventos comunitários;
- número de palestras públicas efetuadas;
- número de encontros comunitários preventivos organizados;
- número de reuniões dos Conselhos de Segurança ou Grupos de Vigilância de bairro;
- número de situações de desordem pacificadas;
- número de atendimentos sociais;
- número de problemas comunitários resolvidos (iluminação, limpeza, terrenos baldios, carros abandonados);
- número de contato de acompanhamento (follow up) com vítimas de crimes” (p. 82).
“Indicadores ‘alternativos’
- utilização pública de espaços comuns: aumento da frequência em parques, áreas centrais antes degradas;
- verticalização da cidade: lançamento de novas unidades habitacionais em condomínios, apartamentos oferecendo segurança;
- volume de vendas de veículos blindados;
- volume de vendas de veículos conversíveis” (p. 82).
“Indicadores mistos: obtidos através de pesquisas de opinião mas que inquerem o entrevistado sobre ‘fatos’ objetivos e não sobre percepções subjetivas
- medidas de autoproteção utilizadas pelas vítimas (pesquisas de vitimização);
- taxa de delinquência auto-relatada (pesquisas de self report crimes);
- taxa de notificação de crimes (pesquisas de vitimização);
- taxa de prevalência de uso de álcool e drogas;
- taxa de vitimização (pesquisas de vitimização);
- taxa de subnotificação;
- custo médio incorrido por ofensas selecionadas (perdas com roubos, furtos e outros crimes contra o patrimônio)” (p. 82-83).
Fonte:
KHAN, Tulio. Indicadores em prevenção municipal de criminalidade. In: SENTO-SÉ, João Trajano (Org.). Prevenção da violência: o papel das cidades. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.